O código de ética é um instrumento que
orienta o profissional intérprete na sua atuação. A sua existência justifica-se
a partir do tipo de relação que o intérprete estabelece com as partes
envolvidas na interação. O intérprete está para intermediar um processo
interativo que envolve determinadas intenções conversacionais e discursivas.
Nestas interações, o intérprete tem a responsabilidade pela veracidade e
fidelidade das informações. Assim, ética deve estar na essência desse
profissional. A seguir é descrito o código de ética que é parte integrante do
Regimento Interno do Departamento Nacional de Intérpretes (FENEIS).
D - Registro dos Intérpretes para Surdos - em
28-29 de janeiro de 1965, Washington, EUA Tradução do original Interpreting for
Deaf People, Stephen (ed.) USA por Ricardo Sander. Adaptação dos Representantes
dos Estados Brasileiros - Aprovado por ocasião do II
Encontro Nacional de Intérpretes - Rio de
Janeiro/RJ/Brasil - 1992.
Princípios
fundamentais
Artigo 1º São deveres fundamentais do intérprete:
1°. O intérprete deve ser uma pessoa de alto
caráter moral, honesto, consciente, confidente e de equilíbrio emocional. Ele guardará informações confidenciais e não
poderá trair confidencias, as quais foram confiadas a ele;
2º. O intérprete deve manter uma atitude
imparcial durante o transcurso da interpretação, evitando interferências e
opiniões próprias, a menos que seja requerido pelo grupo a fazê-lo;
3º. O intérprete deve interpretar fielmente e
com o melhor da sua habilidade, sempre transmitindo o pensamento, a intenção e
o espírito do palestrante. Ele deve lembrar-se dos limites de sua função e não
ir além de a responsabilidade;
4°. O intérprete deve reconhecer seu próprio
nível de competência e ser prudente em aceitar tarefas, procurando assistência
de outros intérpretes e/ou profissionais, quando necessário, especialmente em
palestras técnicas;
5°. O intérprete deve adotar uma conduta
adequada de se vestir, sem adereços, mantendo a dignidade da profissão e não
chamando atenção indevida sobre si mesmo, durante o exercício da função.
Relações com
o contratante do serviço
6°. O intérprete deve ser remunerado por
serviços prestados e se dispor a providenciar serviços de interpretação, em
situações onde fundos não são possíveis;
7°. Acordos em níveis profissionais devem ter
remuneração de acordo com a tabela de cada estado, aprovada pela FENEIS.
Responsabilidade
profissional
8°. O intérprete jamais deve encorajar
pessoas surdas a buscarem decisões legais ou outras em seu favor;
9º. O intérprete deve considerar os diversos
níveis da Língua Brasileira de Sinais bem como da Língua Portuguesa;
10°. Em casos legais, o intérprete deve
informar à autoridade qual o nível de comunicação da pessoa envolvida,
informando quando a interpretação literal não é possível e o intérprete, então
terá que parafrasear de modo claro o que está sendo dito à pessoa surda e o que
ela está dizendo à autoridade;
11º. O intérprete deve procurar manter a
dignidade, o respeito e a pureza das línguas envolvidas. Ele também deve estar
pronto para aprender e aceitar novos sinais, se isso for necessário para o entendimento;
12°. O intérprete deve esforçar-se para
reconhecer os vários tipos de assistência ao surdo e fazer o melhor para
atender as suas necessidades particulares.
Relações com
os colegas
13°. Reconhecendo a necessidade para o seu
desenvolvimento profissional, o intérprete deve agrupar-se com colegas
profissionais com o propósito de dividir novos conhecimentos de vida e
desenvolver suas capacidades expressivas e receptivas em interpretação e
tradução.
Parágrafo único. O intérprete deve esclarecer
o público no que diz respeito ao surdo sempre que possível, reconhecendo que
muitos equívocos (má informação) têm surgido devido à falta de conhecimento do
público sobre a área da surdez e a comunicação com o surdo.
Diante deste código de ética, apresentar-se-á
a seguir diferentes situações que podem ser exemplos do dia-a-dia do
profissional intérprete. Tais situações exigem um posicionamento ético do
profissional intérprete.
Sugere-se que, a partir destes contextos,
cada intérprete reflita, converse com outros intérpretes e tome decisões em
relação a seu posicionamento com base nos princípios éticos destacados no
código de ética. Situações gerais:
1. Você está interpretando para um cliente
surdo e o entrevistador continua dirigindo as perguntas a você ao invés de
fazê-lo ao cliente.
Como você resolve esta questão?
2. Durante uma missa, a única pessoa surda
cai no sono. O que você deveria fazer?
3. No contexto da interpretação, a pessoa
ouvinte diz: "Por favor, não traduza isto..." Qual é a atitude mais
apropriada nesta situação?
4. Quando perguntado sobre um trabalho de
interpretação ocorrido, como você deveria proceder?
5. Se um amigo ou parente de um cliente
pergunta a você sobre detalhes de uma situação em que você interpretou, qual
seria a postura apropriada diante deste fato?
6. Se um intérprete devidamente cadastrado
fala sobre uma confidência, o que a pessoa surda envolvida poderia fazer?
7. Se durante um serviço de interpretação lhe
perguntam alguma informação particular sobre o seu cliente, o que você deveria
fazer?
8. Se a mãe da pessoa surda lhe pergunta
alguma coisa sobre o serviço de interpretação, como você deveria proceder?
9. Você interpretou a "fala" de uma
pessoa surda - da língua de sinais para o português - em juízo. Mais tarde você
se dá conta de ter confundido alguma informação dada pelo surdo. O que você
deveria fazer neste contexto?
10. Um cliente surdo sai da sala para fazer
um intervalo. Quando ele retorna pergunta a você o que foi dito durante a sua
ausência. Qual seria a resposta apropriada?
11. Quando você estiver no seu intervalo e a
pessoa surda lhe pedir para interpretar, o que você deve dizer?
12. Se o palestrante surdo fizer comentários
específicos a seu respeito enquanto intérprete que não sejam verdadeiros, qual
seria a forma apropriada de agir nesta situação?
13. Você é o único intérprete em uma situação
ou evento. Depois de um determinado período, você se sente extremamente
cansado. O que você deveria fazer?
14. Você é o único intérprete em uma sala em
que várias pessoas estão fumando. Há várias pessoas surdas presentes, mas chega
a um ponto que você já não suporta mais o cheiro de fumaça. O que você deveria
fazer?
15. Você está no seu intervalo enquanto seu
colega está interpretando. As pessoas surdas lhe dizem que querem apenas você
como intérprete. Qual seria a forma apropriada de agir nesta situação?
16. Uma empresa lhe contrata para traduzir da
língua de sinais para o português para uma pessoa surda. Quando você chega ao
local, a pessoa surda lhe comunica que irá falar e que não precisa de
intérprete. O que você deveria fazer?
17. Quando interpretando em sala de aula, o
professor lhe pede para não interpretar mais, pois considera possível que você
esteja discutindo sobre as respostas das questões da prova. Como você deveria
proceder?
18. Uma pessoa surda lhe diz que não pode
pagar por seus serviços e que precisa muito de seu serviço. Qual seria a
solução para este problema?
19. Se for necessário interpretar um sinal
que não seja conhecido pela audiência, como você o introduziria?
20. Se uma empresa/instituição contrata o seu
serviço e depois se nega a pagá-lo porque a pessoa surda não compareceu, o que
você deve fazer?
21. Seria aceitável o intérprete abandonar a
interpretação ao saber que não será remunerado pelo seu trabalho?
22. Se o médico começa a discutir em
particular com um colega sobre o caso de seu cliente surdo, o que você deveria
fazer?
23. Enquanto você interpreta da língua de
sinais para o português, ocasionalmente o seu cliente surdo usa a fala, o que
você deveria fazer?
24. Se você não sabe o que fazer em
determinado contexto de interpretação, seria apropriado pedir conselho a um colega
intérprete para resolver a situação?
25. Seria violar o código de ética se um
intérprete compartilha experiências de interpretação em um seminário de
intérpretes? 26. Você pode ser requisitado pelo juiz a depor em juízo sobre
informações obtidas durante interpretações particulares?
27. Você pode discutir sobre interpretações
realizadas que foram públicas?
28. Se a pessoa surda lhe pede para informar
a sua família sobre o que aconteceu em uma interpretação, isso seria permitido?
29. Pode um intérprete servir de advogado
para um cliente surdo?
30. Um intérprete pode interagir com pessoas
surdas durante uma festa?
31. Idealmente, deveria ter um intérprete
para cada palestrante, mesmo se o evento compreenda menos de uma hora?
32. Em uma interpretação individual se você
não entender a pessoa surda, o que você deveria fazer?
33. Se o palestrante está falando muito
rápido, o que o intérprete deveria fazer?
34. O intérprete pode inventar novos sinais
durante uma interpretação?
35. O que o intérprete deve fazer diante de
uma expressão idiomática ou uma metáfora?
36. Quando interpretando para uma grande
audiência surda, qual o nível de língua de sinais o intérprete deveria usar?
37. O que você deveria discutir com a pessoa
surda antes de uma interpretação?
38. Em uma situação clínica, o cliente surdo
usa sinais sexuais que poderiam ser traduzidos de diferentes maneiras. Quais
opções você elege? Por quê?
39. Se o médico lhe pede para sair da sala
para examinar o paciente surdo para quem você interpreta, o que você faz?
40. Em uma interpretação individual, se o
telefone da pessoa ouvinte toca você traduz a conversação?
41. Depois de uma consulta ao oftalmologista,
o paciente surdo pergunta a você se recomenda um local para que ele compre seus
óculos. O que você faria?
42. Se um ouvinte usa o termo
"surdo-mudo", como você deveria interpretá-lo?
43. Você interpretou
um programa na televisão. Depois de uma semana, uma pessoa surda pede a você
para recapitular o programa. O que você faria?
44. Depois de uma consulta, o médico conclui
que o paciente tem AIDS. O médico solicita o nome de seu parceiro e o paciente
surdo recusa-se a dar. Você sabe o seu nome e sente-se na obrigação de
informar. O que você faria?
45. Você está interpretando para um surdo em
um consultório médico. O médico pergunta se o paciente está tomando a medicação
recomendada. O paciente responde que sim. Depois, o paciente lhe informa que
não está tomando a medicação porque sente muito sono quando a toma. Você fica
preocupado porque o uso da medicação de forma apropriada pode ser um caso de
vida e morte. O que você faria?
46. Você é contratada pelo SINE para
interpretar uma entrevista para um emprego. Depois que o empregador explica o
que compreende a função a pessoa surda responde "Eu não quero esta
porcaria de emprego!" 0 que você faria? Você retorna ao SINE e a pessoa
surda mente sobre o que foi dito. Qual o seria o seu procedimento?
47. Você é questionado por requerer duas
horas de interpretação em um serviço que leva apenas 15 minutos. Qual é a sua
explicação?
48. Uma pessoa ouvinte fica fascinada com sua
interpretação e durante o intervalo lhe pergunta quanto que você está recebendo
pela sua função. O que você responde?
49. A polícia telefona para você solicitando
o seu serviço de interpretação para um surdo que cometeu um crime. Você lhes
informa a respeito do valor do seu trabalho e a polícia comunica que não pode
autorizar o seu pagamento, mas que você deve comparecer de qualquer forma. 0
que você faz?
50. Quando interpretando em uma reunião com
mais de um surdo, como a sala deveria ser organizada? Onde você deveria sentar?
Suponhamos que o coordenador da reunião seja surdo. Onde você deveria se
posicionar?
51. Quando você não tem certeza quanto ao
tipo de situação em que você irá atuar, como você deverá se vestir?
52. Quando interpretando para um grupo de
pessoas surdas ou para apenas uma pessoa surda, para onde o intérprete deve
olhar?
53. Se o intérprete não estiver vestido de
forma apropriada para um serviço, mesmo assim ele deveria interpretar?
54. Como a pele da pessoa interfere nas
roupas que o intérprete vestirá?
55. Quando interpretando em um encontro, as
luzes são apagadas e um filme é passado. Você não foi informado que isto
aconteceria. Como você procede nesta situação?
56. A associação de surdos lhe convidou para
interpretar uma peça de teatro. O que você deverá verificar quanto às condições
do local para realizar este trabalho?
Situações específicas da área da educação:
57. Um aluno surdo universitário pede a você
para fazer anotações quando ele não estiver presente na aula, uma vez que você
será remunerado de qualquer forma. Qual seria a forma apropriada de proceder?
58. Um professor tem o hábito de caminhar
pela classe. O que você deve fazer?
59. Se a sala tem janelas, onde o intérprete
deve se sentar?
60. Você é um dos dois intérpretes
contratados para uma conferência em educação. O outro intérprete aparece
vestindo uma roupa não apropriada para a ocasião. O que você faria?
61. Como você procederia se os alunos se
negassem a remeter perguntas ao professor?
62. Como você procederia se os alunos o
elegesse como referência no processo de ensino-aprendizagem?
63. O que você deveria fazer se você fosse
intérprete de uma criança surda em uma escola regular de ensino e ela lhe
dirigisse perguntas a respeito dos sinais utilizados durante a sua
interpretação?
64. Qual a tua atitude diante do fato de ser intérprete de uma
criança surda em uma escola regular de ensino perante o professor?
65. Quais as funções que você assumiria
diante do contexto de sala de aula em que a criança surda elege o intérprete
como referência do seu processo de ensino-aprendizagem?
66. O que você faria se o professor
insistisse em fazer referências visuais concomitantes com a fala
impossibilitando o acompanhamento do aluno surdo em uma escola regular?
67. Como você deveria proceder diante da
complexidade dos conteúdos desenvolvidos nas escolas regulares de ensino em
diferentes níveis de escolarização?
68. 0 que você deveria fazer ao perceber que
o professor está delegando a você a responsabilidade de passar o conteúdo
desenvolvido em sala de aula?
69. Quais as implicações da presença de um
intérprete de língua de sinais no ensino fundamental em que as crianças
normalmente tomam como referência e modelo o professor?
70. Como você pode colaborar com o design e
estruturação do espaço em sala de aula para um melhor aproveitamento do aluno
surdo das aulas ministradas pelo professor?
71. O que você faz se o surdo está
envergonhado e não quer se sentar na posição que seria mais adequado para a sua
participação no processo de ensino-aprendizagem?
72. O que você faz se o surdo lhe pergunta
algo durante a interpretação e você avisa que irá remeter a pergunta ao
professor e o surdo lhe diz " - Não, não precisa perguntar",
percebendo que o aluno está envergonhado de fazer a pergunta ao professor
diante dos demais colegas?
73. O que fazer quando o professor titular
não dominar o conteúdo ou não tiver compromisso com o processo de ensino
aprendizagem?
74. O "professor-intérprete" pode
interferir com comentários a respeito do assunto durante as aulas?
75. O "professor-intérprete" deve
participar de todas as reuniões da escola?
Poder-se-ia continuar estas questões
indefinidamente, uma vez que o intérprete sempre está diante de situações
completamente inusitadas a todo instante. As situações levantadas são apenas
possibilidades e podem jamais vir a acontecer na sua atuação enquanto
intérprete de língua de sinais. No entanto, quanto mais você pensa e reflete
sobre todas as situações possíveis, mais você estará preparado para tomar uma
decisão e
uma postura ética diante de um contexto novo.
Assim, convidamos vocês a refletirem sobre cada uma dessas questões e a
elaborarem propostas para que sejam encaminhados através do MEC a outros
colegas de outras escolas e estados.
A exemplo disso segue-se a reflexão sobre a seguinte questão:
Como se portar diante do contexto de interpretação da língua
portuguesa escrita no momento de provas e concursos?
Sugere-se que se faça a tradução do português escrito para a
língua de sinais de todas as questões da prova. 0 intérprete também deverá fazer
a interpretação das instruções dadas na língua portuguesa falada e/ou escritas
quando estes forem os casos. Durante a prova, o candidato pode dirigir questões
relativas exclusivamente à língua portuguesa: significado, estrutura e
vocabulário. Se por acaso, o candidato sugerir alguma escolha pessoal e
solicitar a confirmação seja ela através do olhar, o intérprete deve lhe
informar que apenas fará a tradução do português para a língua de sinais
deixando claro as suas atribuições durante o processo. Em relação ao processo
de seleção, o intérprete deve informar aos monitores e responsáveis qual a sua
função e como se procederá à interpretação durante a execução das provas e do
concurso de modo a garantir a acessibilidade.
muito interessante
ResponderExcluirMUITO BOM
ResponderExcluir2. Durante uma missa, a única pessoa surda cai no sono. O que você deveria fazer?
ResponderExcluirRsrs. Isso acontece normalmente por alguns fatores. Vou listar alguns daí você pode analisar.
Excluir1º Cansaço físico ou mental da pessoa surda
2º Falta de interesse, cumprindo apenas o protocolo religioso.
3º Interpretação sem sentido, sem uso de gírias ou gramática própria da Língua de sinais.
4º Sem uso de expressões faciais/ corporais por parte do intérprete.
5º Interpretação/ tradução descontextualizada com a realidade da pessoa (cultura, cosmovisão, conhecimento)
Acho que já dá para ter uma ideia do que está acontecendo...